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Prática

Hare Krishna e uma prática de kirtan
Ana Sereno
03-05-2010


Foi na quarta-feira à noite, véspera da folga, que pela primeira vez se cantou o popular mantra a Krishna. O Miguel sugeriu o “tema” e, como tal, foi ele a puxá-lo, enquanto todos nós nos propusemos a responder. Estávamos poucos na sala, pelo menos não tantos como era habitual, uma vez que muitos dos participantes haviam partido. Uma noite tranquila na Quinta das Águias, o silêncio habitual, pontuado aqui e ali pelo ladrar de uma cadela ou do limão, pelos passos de alguém que caminha na escuridão, por algum animal  não identificado que se esconde no bosque.

E círculo, na sala de prática, vamos preenchendo o silêncio com o mantra. Os instrumentos assumem posições, afinam-se notas e escalas, encontram-se ritmos e cadências e, sem darmos conta, estamos a ser arrastados na corrente de sons e palavras que nos levará até aos mais profundo canto da nossa existência. Enquanto alguns optam por fechar os olhos, aprimorando a audição, filtrando a vibração energética produzida pelo kirtan através dos ouvidos, outros escolhem manter os olhos bem abertos e com eles sorrir aos outros, alimentando de forma contagiante a torrente de energia.

Á medida que o volume vai subindo, que o ritmo vai acelerando, que o Miguel vai abrindo   mais e  mais o seu coração, todos nós vamos permitindo também que os nossos corações se abram, que pensamentos e emoções se alinhem com ele, buscando uma comunhão com o divino que reside dentro de cada um que participa naquele momento e que existe, em última instância, em todo o lado, a qualquer momento.

Os sorrisos estampados nos rostos, o brilho que efulge nos olhos, o calor que vai penetrando a pele são os sintomas comuns de quem, por breves instantes, recebe aquele lampejo de moksha, aquela sensação de plenitude na qual não queríamos que nada fosse diferente, de que tudo é exactamente como devia ser. E assim, naquela quarta-feira à noite na Quinta das Águias, em Paredes de Coura, quem ali estava na sala de prática era um só e apenas um só, uma só e a mesma realidade plena, uma só e uma única consciência. Cada papel, cada ego, cada emoção, cada problema, cada conquista, tudo se dissolveu naquele momento em que, no “pico” do kirtan, todos nos elevamos acima da nossa existência manifestada até à fonte de todo o reflexo – a própria consciência.  Foram breves momentos, eventualmente reduzidos a breves segundos, provavelmente nem foram simultâneos, mas certamente, durante aquela meia hora em que preenchemos o silêncio da noite com aquele Hare Krishna, cada um de nós percebeu a razão de ali estar, encontrou a explicação que justifica a nossa busca neste momento, a nossa dedicação ao auto-conhecimento, a nossa devoção ao dharma. 



Este texto foi escrito no âmbito de um relatório de observação durante a Formação em Yoga com  o professor Pedro Kupfer em Agosto de 2009.


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