| Nos últimos tempos temos acompanhado a ocorrência de tsunamis, terremotos (inclusive um em São Paulo), um número recorde de furacões, enchentes, seca na Amazônia, calor sem precedentes, desastres aéreos, maremotos políticos, a eminência de uma pandemia de gripe aviária que poderia matar milhões, surto de febre aftosa. Estes entre outros eventos que surgem nas manchetes de jornais e revistas e fazem pensar que o apocalipse começou e a Terra vive um período de total desequilíbrio. Tudo é impermanente
A imutável mutabilidade. A constante transformação. A dança de Shiva. As idéias da constante transformação da realidade podem ser apresentadas de diversas formas. O fato é que já sabemos, faz tempo, que o universo está em constante movimento. Isso é uma realidade da qual não podemos fugir ou se rebelar. Das galáxias, às estrelas e seus planetas, até a menor partícula atômica, tudo está em constante movimentação. A crosta terrestre e sua dinâmica geológica, o fluxo de correntes oceânicas e as massas de ar, também fazem parte dessa realidade. A organização social e cultural do homem também não está livre dessas constantes transformações e adaptações. Os estilos de vida, hábitos e valores são moldáveis e vêm se transformando ao longo da história. Da vida nômade, coletor-caçadora, à estabelecida no fértil-crescente; da vida feudal da idade média, à cosmopolita das grandes metrópoles de hoje: da vida greco-romana de ontem, ao estilo ocidental de hoje; foram grandes as mudanças e adaptações. Para alguns, desde o período colonial vivemos a era da globalização. A redução das distancias, graças a barcos à vela e depois as locomotivas a vapor, colocou em contato culturas completamente diferentes, que se influenciaram simultaneamente. Outros preferem o termo "mundialização" e dizem que a era da comunicação põe frente à frente cultura de massa e regional, modificando-as irreversivelmente. Ação e reação
O conceito de Karma, do sânscrito ação, tem paralelo na física newtoniana, na idéia de ação e reação e na física quântica, onde tudo está interdependente e conectado. O homem, através de suas ações, vem construindo, portanto, seu destino, e com o aumento de seu poder sobre a natureza, tornou mais visíveis suas reações. É claro que movimentos tectônicos e oceânicos já acontecem muito antes da existência do homem. Mas seria imprudente afirmar que o desmatamento, a poluição do meio ambiente e porque não, a violência contra os animais, não tem trazido reações da natureza. O aparecimento de doenças como a gripe aviária, surto de febre aftosa, a vaca-louca, entre muitas outras, é atribuído segundo especialistas, como conseqüência da criação desumana e intensiva de animais, que se vale da utilização em larga escala de remédios, hormônios e antibióticos. As doenças, bactérias e vírus dessas criações, se fortalecem e sofrem mutações, passando a acometer também humanos, como aconteceu em 1918 com a morte de 50 milhões de pessoas, em conseqüência da gripe espanhola - uma mutação da gripe de aves. A seca na Amazônia tem relação direta com o desmatamento colossal, promovido por pecuaristas a fim de produzirem mais áreas de pastos em detrimento das florestas. A poluição do ar, rios e mares têm influência no aumento da temperatura global. Pode ser doloroso perceber que o nosso ‘way of life' contribui para essas ocorrências. Kali Yuga
Na cosmogonia hindu, são descritas quatro grandes idades ou eras. Seriam ciclos relacionados a um dia de Brahman, que compreendem a criação e a renovação. Na Satya Yuga, idade da veracidade, ou era de ouro, o homem estará com sua inteligência sobremaneira desenvolvida e trabalhará em harmonia com o plano divino. Na Treta Yuga, a era de prata, haverá conhecimento generalizado das comunicações telepáticas e outros anuladores de tempo. Na Dwapara Yuga, a era de bronze, haverá desenvolvimento da sabedoria e conhecimentos. Na Kali Yuga, a idade de Kali, ou era do ferro, haverá confusão, sofrimento, conflitos, ignorância e materialismo. Muitos enquadram a contemporaneidade na era de Kali, por motivos óbvios. Yoga e a consciência
O hatha yoga surge como meio de transcendência, indicado para Kali Yuga e ao contrário do que pode parecer ao leigo, não propõe uma vida surreal, num país onde todos só se dedicam a contemplar. Propõe sim, o vajra deha, o corpo adamantino que, graças ao calor da pratica constante, torne-o preparado para a vida nessa era. E apto para poder suportar os estágios de "supra-consciência" (samadhi). A prática de yoga torna os músculos e órgãos tonificados e bem oxigenados, libera tensões, estimula o bom funcionamento do metabolismo, torna o corpo e a mente flexíveis e criativos, aguça os sentidos e a intuição, potencializa a percepção do Ser e a capacidade de concentração. Por ser um mergulho em si, promove auto conhecimento. Por estudarmos nosso interior, nossos condicionamentos, comportamentos, limitações, medos, reações e fluxo de sentimentos, desenvolvemos equilíbrio emocional. E isso tudo nos deixa mais aptos para escolhermos cada ação. O yoga ajuda-nos a não confundirmos o real valor das coisas. Coisas são coisas e pessoas são pessoas, como diria o professor Pedro Kupfer: "Você pode perceber de fato que um carro é algo que te leva do ponto A ao ponto B, não qualquer outra coisa". Não confundirmos, por exemplo, a pratica de yoga com rebuscamento estético, mas para ficarmos mais conscientes, para tomarmos contato com nossa essência. Senão, corremos o risco de, ao invés de transcendermos o ego, torná-lo inchado. Podemos perceber que nosso ‘way of life', muitas vezes pode e deve mudar, e que isso trará muitos benefícios para nós mesmos e todo o planeta. Que determinada ação, mesmo que aparentemente insignificante, influencia o todo e nos trará certas conseqüências. Os "tsunamis", que vezes por outra acontecem em nossa saúde, ou vida pessoal, tem total ligação com escolhas que fizemos. O yoga ajuda-nos a estarmos mais presentes no aqui-agora. Ao invés de colocarmos nossa mente no futuro, no passado, ou de agirmos por automatismo, tomamos as rédeas de nossas ações. Muitas vezes, em nosso íntimo, sabemos que devemos tomar certa atitude, mas por força de costume, de hábito, ficamos repetindo padrões condicionados de comportamento. Um réquiem para a felicidade. Se o Yoga puder despertar nossa consciência mais pura e conseguirmos compreender e aceitar a existência de nossos padrões repetitivos, e tomar consciência de que eles não nos conduzem à felicidade, poderemos modificá-los. Vivendo o Dharma Dharma significa retidão ou justiça. Segundo o estudioso hindu Harish Johari, o dharma é: "A lei inerente à natureza. Aquilo que apóia, o que mantém unidas as pessoas, um conjunto de princípios para viver uma vida harmoniosa e benéfica". Quando estamos vivemos de acordo com o Dharma e fazendo aquilo que nossa essência nos diz que devemos fazer, encontramos paz e harmonia. Devemos manter um contato íntimo com nossa essência para que possamos viver aquilo que sentimos/sabemos ser ético, e não pautarmos nossas ações por pressões externas, como a pressão de familiares, da máquina de propaganda e da moda, por exemplo. Tsunamis de informação - mantendo-se fora do turbilhão
Nossa mente precisa de repouso às vezes. Um verdadeiro "tsunami" de informação entra em nossa mente e muitas vezes ficamos completamente passivos e até apáticos. A capacidade de criarmos fica prejudicada e fortalecemos um hábito de apenas receber informações, não que isso seja abominável, mas fazer, agir e expressar-se também é igualmente muito importante. Afastarmo-nos da televisão, do rádio, e da internet, às vezes, pode desacelerar um pouco a mente agitada e hiperestimulada, principalmente nas grandes cidades, e trazer novas idéias e novos "insights". Isso pode fortalecer a capacidade de tomarmos atitudes e criarmos. Ou simplesmente pode melhorar a capacidade de escolha das informações. As informações são verdadeiros alimentos para nossa mente, e que por ficarem habitando nosso espaço interno, influenciam nossas ações, sentimentos e, por conseqüência, nosso destino. Nessa época temos uma quantidade de informação sem precedentes. Com tanta informação disponível e invasiva, especulativa ou mesmo verídica, devemos aprender a selecioná-las e dimensionar uma quantidade de tempo que seja saudável para recebê-las. Que isso não seja interpretado como alienação, uma vez que temos que viver a vida prática e não podemos deixar de lado muitas coisas. Informações sensacionalistas ou em excesso, podem apenas piorar a situação, tirando-nos de nosso foco, deixando-nos hiperestimulados, perdidos e sem direção. Conclusão Não podemos controlar as forças da natureza, que por muito tempo existem e por muito tempo existirão. Estamos sujeitos a ela e não estamos imunes às suas forças, mesmo que às vezes nos sintamos inatingíveis. Só podemos controlar nossas ações e escolhas, que afetarão a natureza e, por sua vez, terão conseqüências para nós mesmos. Se nos esforçarmos para vivermos conscientes, com sabedoria na prática, inclusive nas pequenas ações do cotidiano, e em contato com a essência, não há outro resultado a não ser o de estarmos em direção a mais suprema e vibrante felicidade. Mesmo por entre "tsunamis" e furacões o yogi vive feliz cumprindo seu Dharma. Bruno Bartulitch |