Era uma vez um grande erudito que morava em Allahabad. Ele era muito versado nas escrituras e também muito gordo, dado à indolência e aos prazeres da boa mesa. Numa ocasião, precisou cruzar o sagrado rio Gaṅgā de barco, para participar de uma pūjā na outra beira.
Conversando com o barqueiro, este sábio, que era filho e neto de sábios, que conhecia os Vedas de cor e salteado, lhe diz: "é impossível viver sem conhecer o vyakarāna, a ciência da gramática sânscrita. Você conhece essa ciência?" O barco está andando pelo rio.
O barqueiro diz "Vyakarāna? Nunca ouvi falar". O paṇḍitaḥ diz que ele perdeu um terço da sua vida. Lhe faz outra pergunta: "Você conhece a literatura sânscrita?" O barqueiro diz que não, que não teve ocasião de estudar pois rema no rio desde criança.
O erudito lhe diz que, por causa disso, perdeu outro terço da sua vida. "Você sabe ler e escrever?", pergunta. Novamente, a resposta do barqueiro é negativa.
O paṇḍitaḥ diz que o barqueiro perdeu a vida inteira, já que vive sumido na ignorância. Dali a pouco, um redemoinho pega o barco, que fica à mercê da forte correnteza, bate numa rocha e começa a afundar. O erudito se desespera.
O barqueiro lhe pergunta: "Você sabe nadar?" Ouvindo a resposta negativa do outro, diz: "Então, você perdeu a sua vida inteira, agora. Desculpe, mas com esse seu peso não vou conseguir lhe ajudar!" E sai nadando até a beira, enquanto o paṇḍitaḥ se afoga.
Então, de que adianta conhecer todas as disciplinas se você não sabe o fundamental? De que serve a teoria, de que serve conhecer coisas mundanas, se não soubermos nada sobre nós mesmos? Narração de Pedro Kupfer de uma história tradicional.
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