Shítalí é um dos pránáyámas clássicos do Hatha Yoga e tem como marca distintiva a inspiração feita com a língua em calha. Segue-se a descrição:
a) Colocar a língua em forma de calha entre os dentes semicerrados, projectando-a para fora da boca, sem tensão;
b) fazer uma inspiração completa pela boca, fazendo o ar atravessar o canal formado pela língua;
c) fechar a boca com a língua recolhida e reter o ar;
d) expirar lentamente pelas narinas.
Verifica-se que uma boa parte dos praticantes não consegue colocar a língua em calha. Segundo o Swami Satyananda isso acontece por uma questão genética que afecta um terço da população mundial[1]. Aqueles que não beneficiam da genética necessária ao shítalí podem beneficiar da prática do shítkarí. O shítalí pránáyáma a par do shítkarí (já descrito) são os únicos dos pránáyámas clássicos com inspiração pela boca e também por isso partilham muitos dos seus efeitos, precauções e contra-indicações. Recomenda-se, por isso, a leitura do que se escreveu na edição anterior quanto ao shítkarí pránáyáma.
À semelhança do shítkarí, o shítalí elimina o calor, a sede e a fome, acalma a tensão nos olhos e ouvidos, melhora a digestão e reduz a tensão alta e o efeito da halitose. “É indicado para ser feito durante o jejum, pois elimina as sensações de sede, de fome e refresca o hálito”[2]. Swami Shivananda afirma que quem pratica este pránáyáma regularmente não é afectado pelas mordidas de cobras e escorpiões[3]. De todo o modo, e à cautela, desaconselha-se a experiência.
O efeito refrescante existe não só a nível físico, mas também a nível emocional e mental e é especialmente indicado para o pitta dosha. O shítalí produz um aquietar emocional e mental.
De início, a retenção com ar não deve ser muito extensa e pode ser acompanhada com o khecharí mudrá ou jalandhára bandha e múla bandha, se for mais mais prolongada.
Eis o que nos diz a Hatha Yoga Pradípiká[4] sobre este pránáyáma:
“Para fazer shítalí, inala-se através da língua, colocada em forma de calha. A língua imita o bico de um pássaro, ficando projectada um pouco para fora dos lábios; na sequência exala-se lentamente pelo nariz.
Este kúmbhaka cura doenças do abdómen e do baço, entre outras; também evita febre, tendência a sofrer transtornos biliares, fome, sede e neutraliza o efeito dos venenos.” (II, 57-58)
Gheranda Samhitá:
“Puxe o ar através da boca (com os lábios contraídos e a língua fora), e encha o estômago lentamente. Retenha por pouco tempo. Depois exale por ambas as narinas.
Que o Yogí pratique sempre este shítalí kúmbhaka, doador de felicidade; assim ele será livre de indigestão, desordens da bílis e da fleuma[5].”
Este texto dá-nos duas directrizes. A primeira é a referência à respiração abdominal - “encha o estômago”. E a segunda, para uma retenção curta. Isto enfatiza que o foco deste pránáyáma não está na retenção, mas antes na inspiração. A atenção deve permanecer na língua e na sensação de arrefecimento.
E por fim, a Hatharatnávalí de Shrínivásasa:
“Puxa-se o ar através da língua retém-se da maneira descrita anteriormente e depois exala-se lentamente (através das narinas). Isto deve ser feito por oitenta ciclos.
shítalí kúˆbhaka remove a hidropisia, desordens do baço, febre, acidez e toxicidade, e controla a fome e a sede. [6]” (II, 19-20)
O texto (II, 7) tinha dado uma descrição genérica para todos os pránáyámas sobre como fazer a retenção: “jalándhara deve ser praticado depois de púraka [inspiração], enquanto o uddiyána deve ser praticado no fim de kúmbhaka, mas antes de rechaka [a expiração] começar. [7]”
Muitas vezes estes pránáyámas de inspiração pela boca são tidos como menores em comparação com os demais pránáyámas clássicos, mas Srínivása atribui-lhes grande importância ao recomendar que se façam oitenta ciclos, contrariando assim aquela tendência. Experimente fazê-lo em dias de jejum, de muito calor ou antes da meditação e perceba a sua utilidade e potencial.
[1] Swami Satyananda, Asana Pranayama Mudra Bandha, 3ª Edição, Yoga Publications Trust, 2002, Índia, pag. 387.
[2] Pedro Kupfer, Guia de Meditação, 3ª Edição, Instituto Dharma, 2001, Pag. 62.
[3] Swami Sivananda, The Science of Pranayama, 17ª Edição, The Divine Life Society, 2001, Himalayas, Índia, pag. 78.
[4] Svátmáráma Yogendra, Hatha Yoga Pradípiká, Tradução de Pedro Kupfer, Instituto Dharma-Yogashala, 2002, Florianópilis, Brasil.
[5] Tradução para o português feita pelo autor a partir de The Forceful Yoga, Being the Translation of Hathayoga-Pradípiká, Gheranda-Samhitá and Shiva-Samhitá, tradução para o Inglês de Pancham Sinh e Rai Bahadur Srisa Chandra Vasu, 1ª Edição, Motilal Banarsidas Publishers, 2004, Delhi, Índia.
[6] Shrínivásayogí, Hatharatnávalí, Tradução de Dr. M. L. Gharote, Dr. Parimal Devnath e Dr. Vijay Kant Jha, Lonavla Yoga Institute, 2002, Lonavla, Índia, pag. 44. Tradução para o português do autor.
[7] Shrínivásayogí, Hatharatnávalí, Tradução de Dr. M. L. Gharote, Dr. Parimal Devnath e Dr. Vijay Kant Jha, Lonavla Yoga Institute, 2002, Lonavla, Índia, pag. 47. Tradução para o português do autor.
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