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Ensinamento

Ética para a viagem
Ana Sereno
12-09-2008


Desde crianças somos confrontados com aquilo que é correcto e incorrecto. Os desenhos animados são uma das primeiras formas de confrontação com este tema. Há sempre o “bem” e o “mal” personificados no “clube dos bons”, geralmente muito belos e coloridos, e no clube dos maus, os mais feios monstros que a imaginação possa conceber. Imediatamente, sem que ninguém precise dizer nada, sem que os pais necessitem de intervir, escolhemos torcer pelo “clube dos bons”.

Porque é que com o crescimento esta escolha deixa de ser tão óbvia ou tão intuitiva? Porque é que muitas vezes passamos para o lado dos “maus” e começamos a espalhar o sofrimento na nossa “mundolândia”?

Talvez porque as sociedades que integramos nos ensinem a ter desejos de possessão e a basear a nossa felicidade na concretização destes desejos a qualquer preço, sem olhar a meios para atingir os fins. Vivemos para a satisfação das experiências, das expectativas, e dos sonhos e a pouco e pouco esta ansiedade e insatisfação permanentes vão-se materializando numa cegueira constante e num enorme equívoco existencial, que podemos denominar de ignorância. Mergulhados nesta ignorância confundimos o certo e o errado, o “clube dos bons e dos maus” e perdemos o rumo.

Hoje em dia, no Ocidente, viver uma vida simples e desapegada não é visto como algo de positivo ou desejável, mas sim como falta de ambição, cobardia ou preguiça. O contentamento é visto como inércia, e o que é socialmente correcto é lutar para ter sempre mais e mais.

 

Regras de navegação

 

Como viver aqui e agora, livres de pressão e de sofrimento, se não integrarmos o sistema pré-estabelecido?

Há duas receitas que a alguns poderão parecer simplistas e que, de facto, são tão óbvias que custa a crer, mas que para mim têm resultado: “não fazer aos outros aquilo que não gosto que me façam a mim”, “pensar conscientemente cada acção que executo, sabendo que inevitavelmente desencadeará um efeito. É tão simples quanto isto! Este é o segredo! Para quê ligar o “complicómetro”? São as mesmas duas regras que ouvíamos em casa quando crianças, porque é tão difícil recordá-las agora? “Não batas ao teu irmão, porque senão ele também terá o direito a bater-te”. “Não ponhas a mão no ferro, porque senão vais-te queimar.”

Estamos a viver um período no qual parece que perdemos o mapa da estrada, andamos tontos e perdidos, já nem sabemos bem qual é o destino da viagem. Face a isto alguns preferem levar uma vida sem regras, “freestyle”, à luz do álibi do “carpe diem”, ignorando o facto de que todas as suas acções terão repercussões. Outros preferem entregar os rumos das suas vidas a líderes, instituições ou rituais, furtando-se a assumir sequer a responsabilidade pelas suas próprias acções.

Vamos para para pensar! Vamos usar a bússola que temos cá dentro, a mesma que em crianças nos fazia torcer pelos “bons”, e vamos tentar viver melhor. É tão natural perceber que a violência não é desejável. Todos sabemos que não devemos magoar-nos, nem magoar o próximo. É tão natural percebermos que devemos ser verdadeiros (já dizia a minha mãe “mais depressa se apanha um mentiroso do que um coxo”). É tão natural viver com honestidade. Não conheço ninguém que dentro de si não tenha esta escala de valores, não conheço ninguém que não queira ser feliz.

 

Yoga, o mapa para encontrar a bússola

 

Na minha opinião, o que o yoga nos propõe é voltar a encontrar esta bússola ética que temos cá dentro para assim vivermos melhor. Ora assim sendo, o yoga é para todos, todos nós que, sem excepção, queremos ser felizes.

Estou muito agradecida ao yoga e aos meus professores por me terem mostrado isso. Por me terem ensinado que o yoga não é só ficar de cabeça para baixo, a respirar pelo nariz em cima de um tapete, mas que existe uma ordem universal e que devemos viver alinhados com ela, pois tudo o que fizermos terá resultados de alcance incalculável.

A minha experiência é curta mas muita coisa mudou desde que o yoga me “piscou o olho”. Vivi a minha adolescência distraída com os rapazes, as paixonetas, as férias loucas com as amigas, as festas e as experiências do álcool, do fumo, das drogas, enfim o cardápio completo de um adolescente dos anos 90. Não rejeito estas experiências e não lamento sequer tê-las vivido, mas sinto-me eternamente grata por ter percebido que elas não são a minha felicidade e por ter deixado de viver para a sua satisfação. Vivo agora de forma menos distraída, mais acordada e mais consciente, embora a estrada ainda seja longa. Percebi que não estou sozinha na minha “mundolândia” que todos os seres que aqui estão sofrem os efeitos dos meus actos. Concretizando: deixei de fumar, pela minha saúde, pela saúde daqueles que me rodeiam e pela saúde do planeta; deixei de comer carne pelo bem-estar dos animais, que tal como os humanos têm o direito à vida; abstenho-me de matar aranhas, moscas e mosquitos que antes esmagava colericamente com o chinelo contra a parede do quarto; ofereço uma parte do meu tempo e do meu dinheiro para tentar ajudar um grupo de sem-abrigo da minha cidade... E para além destas pequenas acções, que são ainda grãos de areia numa praia de coisas a melhorar, procuro levar o yoga no bolso em todos os momentos da minha vida. Esforço-me por manter-me no presente a cada segundo, permanecendo de olhos bem abertos a cada momento. Isto reflecte-se imediatamente num aumento da objectividade na análise que fazemos das mais prosaicas situações do dia-a-dia, e se antes no trânsito 10 em 10 vezes desesperava, buzinava e me irritava, agora já só 5 de 10 vezes isto acontece.

Eu encontrei a bússola ética, o mapa da minha viagem, e se durante este percurso tiver conseguido indicar o caminho a algumas pessoas, salvo a vida de uma vaca, 20 galinhas, 50 sardinhas e 100 flores, então já viverei feliz para sempre como nos desenhos animados.


Ana Sereno brinca de jornalista, mas leva a sério o Dharma e o Yoga. 


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