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Prática

Japa
Miguel Homem
01-06-2010


Existe um método, revelado pelas escrituras, para ganharmos uma rédea sobre a nossa mente. Esse método é japa. Japa é a repetição de uma palavra, frase ou verso usados durante a meditação. O que caracteriza o japa é a repetição.

O que caracteriza o pensamento humano é que ninguém sabe qual será o próximo pensamento. Às vezes os pensamentos sucedem-se com uma aparente lógica, outras vezes sucedem-se sem qualquer lógica aparente. Por vezes surgem-nos pensamentos capazes de nos fazer corar ou envergonhar a nós mesmos, e que nem para nós queremos admitir. Isto acontece, porque não sabemos qual será o próximo pensamento. No pensar desatento, os pensamentos sucedem-se e nem sequer podemos dizer que houve uma distracção porque não existe uma direcção traçada.

Na prática de japa sabemos exactamente qual será o próximo pensamento. Se eu escolhi om shivaya namah, sei que a seguir se segue om shivaya namah e depois de novo om shivaya namah. Se algum pensamento distinto ocorre podemos identificá-lo como uma distracção e trazer a mente de novo para a ocupação escolhida.


Aprendemos a reconhecer as sucessivas distracções sem nos deixarmos arrastar por elas. Neste processo aprendemos a abandonar pensamentos indesejados e a ater-nos àqueles que escolhemos. Ao trazer a mente de novo para aquela ocupação descobrimos um espaço de à vontade interno que nos permite examinar os nossos pensamentos. Este espaço de há vontade para olhar para as nossas emoções e pensamentos sem receio é muito importante e com isso a mente adquire santah, paz e tranquilidade, bem como samádhánam, concentração. Este é um fruto importante da prática japa.


A repetição e o espaço de silêncio


Entre os pensamentos existem intervalos. Normalmente, como o pensamento é encadeado, essesilencio0502_keep_silence espaço não é notado. Do chocolate para a Suíça e da Suíça para os bancos suíços e dos bancos para o empréstimo do carro há uma conexão que me faz cego ao espaço entre cada pensamento.

A repetição de um mantra impede essa conexão, porque entre um om namah shivaya e outro om namah shivaya não existe conexão. Cada mantra é um pensamento completo em si e, por isso, o intervalo, o espaço de silêncio entre cada mantra pode ser percebido. Existe sempre um espaço sem pensamento entre cada pensamento, um intervalo de silêncio. Este intervalo de silêncio é o que chamamos de paz.


Não notamos este espaço entre pensamentos sucessivos, porque o fluxo do pensamento é saudavelmente rápido. No entanto, entre cada pensamento existe um momento em que não existe um pensamento tangível. Apesar disso, eu mantenho-me presente na forma de um momento livre de pensamento - consciência, sem forma, silêncio. Nesse espaço, existimos como silêncio.
Às vezes como silêncio, depois pensamento, silêncio, pensamento. Assim, corre a mente. A questão é se sou silêncio antes do pensamento e depois do pensamento, não serei durante o próprio pensamento?

Se a minha natureza intrínseca fosse o pensamento, então ele teria de estar sempre presente, porque eu estou sempre presente. O pensamento não poderia sofrer qualquer alteração. A verdade é que o pensamento muda constantemente enquanto eu me mantenho como presença testemunha. Da mesma forma testemunho o silêncio entre os segmentos do pensamento.

É curioso como o ser humano se lança numa busca por paz; faz, esforça-se e desespera-se em busca de paz, quando na verdade a paz está sempre presente. É necessária uma acção, um pensamento para quebrar a paz, mas não para tê-la, porque ela é o substrato de todo o pensamento e o intervalo entre cada um. Assim, Vyása no seu comentário aos Yoga-Sútras (I-1) afirma que samádhi é o atributo universal da mente, permeando todos os seus planos.
A verdade também é que os pensamentos surgem por si mesmos. Alguma coisa inevitavelmente gera uma nova onda de pensamentos. É assim que surge a irritação, a tristeza, a ansiedade, o medo, o apego e o desespero. Ninguém os quer, mas eles surgem e não é fácil dar-se conta do seu início. A dificuldade está no facto do nosso pensamento ser associativo, de um para o outro e não um pensamento fragmentário. 

A prática de japa interrompe essa associação encadeada de pensamentos e revela o silêncio entre dois pensamentos. Esse silêncio é então percebido como natural e a inquietude como uma construção mental. Durante o japa percebemos que para o silêncio nada precisa ser feito, mas para o interromper o pensamento que surge foi deliberadamente alimentado. Este processo é testemunhadodurante o japa


No Panchadasi de Sri Vidyaranya, a mente é comparada a uma bailarina que dança num palco iluminado. A bailarina interpreta uma série de sentimentos e estados de espírito, mas a luz que a ilumina permanece sem se envolver, sem ser tocada pelo que ilumina. Entre cada acto, a bailarina recolhe-se e a mente ilumina o palco vazio. A luz não age, nem interpreta, apenas revela. Da mesma forma, apenas iluminamos o que acontece na mente e entre pensamento iluminamos o palco onde eles ocorrem, o palco de silêncio que somos. Antes de cada pensamento o silêncio, entre cada pensamento o silêncio, depois de cada pensamento o silêncio. A prática do japa não ensina, mas dá uma experiência na qual o que já foi ouvido e compreendido pode ser assimilado - o silêncio revela a nossa verdadeira natureza, consciência, chaitanya.

Assim, na prática de japa começamos por manter a atenção na repetição, no som, mas aos poucos transferimos a atenção para os intervalos entre os sons. Não passamos à repetição seguinte sem ver e assumir esse silêncio. Aos poucos, do padrão pensamento - silêncio - pensamento passamos para o padrão silêncio - pensamento - silêncio. Quando um pensamento surge trazemos de novo o mantra. Este processo de japa feito de forma disciplinada faz-nos tomar contacto com quem somos. E somos esse silêncio que é plenitude.
Desta forma, a prática conjugada com a visão tat tvam asi torna-se eficiente.


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